Doutor,
eu tinha acabado de sentar na poltrona do cinema. Tentava me ajeitar quando ela sentou do meu lado. Sorriu. Sorrimos.
- Quer pipoca?
- Não, eu...
- Shiu, vão começar os trailers!
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- Gostou do filme?
- Achei uma merda. Excremento puro. Baita enrolação! Deu vontade de estrangular o diretor com as tripas do roteirista.
- Hum, eu até gostei...
- Você não pode estar falando sério! Esse lixo?
- É.
- Qual é o teu nome?
- Zebedeu.
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Ela se chamava Lia. Assim, só três letras. Não precisava mais do que isso para defini-la. As redundâncias de seu caráter eram irrelevantes. Sem idiossincrasias desnecessárias. Sabia o que queria e não gostava de perder tempo.
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Bem que tentamos chegar até meu apartamento, mas acabamos trepando na escada mesmo, graças ao elevador quebrado. Ela não conseguiu agüentar. Nem deu tempo de tirar toda a roupa. Foi uma rapidinha bem meia-boca. Mas ela gozou.
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- Alô.
- Oi.
- Oi! Eu ia te...
- Vamos encher a cara?
- Como é?
- Preciso ficar bêbada. Vamos?
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Nem bem tínhamos chegado e já foram quatro tequilas pra conta. Duas para cada um. Ela se soltou. Me puxou e me deu um beijo alcoolizado. Pra variar, fiquei de pau duro. Ela riu. Brincou com uma menina na mesa do lado, usando meu estado como de objeto de inveja. E riu quando ruborizei. Pediu mais uma tequila. Implorei para acompanhá-la.
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O quarto girava em sentido oposto ao dela. Estava difícil ficar de pé. Sentei na borda da cama. Ela veio dançando e sentou no meu colo.
- Sabe de uma coisa?
- Não.
- Sabe sim.
- Sei nada...
- Sabe. Sabe que eu te amo, não sabe?
Pior que sabia.
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- Porra, fecha essa porta!
- Ué, qual o problema?
- Coisa mais broxante ver mulher cagando!
- Ué, pra enfiar a cara na minha buceta você não reclama...
- Caralho, que nojo!
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Bêbada de novo. Foi sozinha. Não estava mais com saco para aquilo. Tinha que trabalhar no dia seguinte. Amparei-a antes que caísse.
- Você não me ama!
- Não fala merda. Vem, vou te dar um banho...
- Não! Não quero! Vou embora!
- Lia...
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Seus joelhos miravam o teto, minha cara enfiada na junção de suas coxas. Que cheiro bom, que delícia! Molhadinha. Minha língua percorria cada canto. Me perdi naquele fosso de carne quente e úmida, aberto, escancarado para mim. Tanto que não percebi que ela chorava.
Acordei sozinho.
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Ela não apareceu o dia inteiro. Nem de noite. Não dormi.
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A porta estava aberta quando cheguei. Vi seus tornozelos esticados balançando como os de um judas ao vento no meio da sala, a cabeça tombada sobre um dos ombros, a corda no pescoço sustentando o corpo inteiro no ar. Estava cinza e fria. Olhos esbugalhados, língua azul. Mas continuava linda.
Em cima da mesa um bilhete: "Sua culpa".
Fui embora. Deixei a porta aberta para que os vizinhos encontrassem seu corpo. Mas levei o bilhete comigo.
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Quando cheguei em casa preguei o bilhete na geladeira. Reli (Re-Lia?) umas duzentas vezes e então corri para o banheiro e vomitei.
De porta aberta.
Cara, que semana!
3.10.06
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Esporrado por Zebedeu às 18:58
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