6.9.06

Ex gato lógico

Doutor,

eu estava caindo pelas tabelas de sono. Noites mal dormidas sem razão aparente, ou cheias de razão na mente, mas desordenadas o suficiente para a insônia se deleitar. E eu fritar nos lençóis. Foda. Cama fria, noite gelada, pés úmidos, saco embutido. Nada, nada. Eu, acordado. Quando consegui fechar os olhos o despertador me avisou que já era tarde. Acorda, cretino, que o trabalho te espera. Tomar no cu.

Dureza tomar banho no frio. E é na hora de acordar o sono vem. Nem o choque da água pelando me despertou. Quase dormi no chuveiro, de pé e com o sabonete pendendo nos dedos frouxos. Meu pau se escondeu na mata pentelhal. Se falasse com certeza diria que hoje não sairia dali. Nem a pau. Pica esperta. Expulsei-a de seu abrigo e sacudi-a até a ereção. Depois deixei ela quieta, dura e pulsante, à espera de uma punheta. Se eu também tinha acordado sem objetivo, não estava mais sozinho. Analise isso, se puder.

Trânsito moroso. Vim por instinto. Cheguei até minha mesa e liguei o computador. Tentei ordenar as idéias até o dia anterior. Confirmei que não tinha nada pra fazer. Nunca tinha. Mas já previ o desastre. A mente desocupada é o jardim de Morfeu. O Diabo já determinou usucapião, mas o homem-da-areia vive declarando terra improdutiva e invade. Briga chata. Fiquem os dois, de braço dados que nem dois caubóis viados. Mas não me encham o saco.

Navego pelas páginas habituais, até não ter mais nada de novo para ler. Invento algum interesse, abro várias outras páginas. E vejo as letras embaralharem e fenecerem no limbo do meu sistema límbico. Não me venha com parassimpatias. Preciso dormir, não trocadilhar. Trocadilho é o humor mais rasteiro e egoísta que existe. Só ri quem conta. É o Chevette '76 do humor.

Depois do almoço piorou. Arroz, tutu, calabresa, ovo e bisteca. Só faltou a caipirinha. Meu estômago resmungou a sesta. Meu cérebro fechou para balanço temporário. Decidi que não era hora para desmaiar no teclado então fui ao banheiro. Me tranquei numa cabine, calei a Deca Boca-de-Caçapa e fiquei uns 5 minutos tentando achar uma posição minimamente confortável em meio aos sons viscerais e gravitacionais de meus vizinhos. Escatologia é uma aula de física. A molecada aprenderia muito mais se os exercícios usassem a defecação como exemplo prático. Merda por merda... Uma sinfonia de onomatopéias. Orquestra Cacofônica do Estado de Piriri, a única que não tem Maestro, tem Maelstrom (procura no Google). Tchibuns e plopes dos toroços, chis de xixis, traques variados de cus idem, desde os assovios apertados até os beligerantes ra-ta-tás, blams e plects de portas e tampas, e o complexa digestão esgotal das privadas após apertar o botão de descarga. Uma canção de ninar de merda, um lullabie fecal.

Dormi.

Acordei meia hora depois, com as costas doendo e as pernas formigando. Fingi uma descarga, limpei minhas mãos limpas e saí mancando até minha mesa. A cara inchada e os cabelos desgrenhados. Alguém fez um comentário sem graça. Rosnei uma resposta que não saberia dar. Sentei na minha mesa e percebi que a meia hora de desaparecimento não fez a menor diferença. Ninguém notou minha ausência. Nada mudou. Apenas um lapso temporal, uma volta de 180º sem mudança de sentido ou de destino.

Decidi escrever para você.

Triste isso, não?